quinta-feira, 3 de janeiro de 2013

Quando a gringa sou eu

Enfin, France! Cheguei aqui há exatamente uma semana, após um voo sem turbulências e sobressaltos. Desembarquei em Paris e peguei  a conexão rumo à cidade de Lyon, mais ao sul da França. Lá encontrei com duas pessoas queridas que acabavam de chegar de Barcelona. Tomava um chocolate quente quando uma delas me avistou do alto de uma escada rolante e acenou. Começavam aí as minhas 6 semanas de gringa, aos 8 graus de temperatura.  Tomamos o trem até o apartamento "cool" onde ficamos por três dias. Durante nossa estada, visitamos uns lugares incríveis tais como a imponente igreja de Fourviere, as margens frias do rio Rhone e algumas ruelas misteriosas e encantadoras. No domingo, pegamos o TER (trem) e rumamos para Paris...E o que dizer dessas famigeradas 5 horas de viagem? Os ouvidos e narizes mais sensíveis, certamente, compreenderão o nosso martírio. Passemos a ele. Na cabine ao lado da nossa, um grupo de jovens pra lá de embriagados falava alto, gargalhava e - não bastasse isso -  começou a cantar e dançar "Gangnam style" no corredor do trem. Concomitantemente, uma francesa, um bebê de 3 anos e milhares de malas resolveram sentar na cabine onde estávamos. E foi aí que...fedeu! A francesa fedia - e fedida - foi sentar ao lado de quem? De moi! E, como se não bastasse o seu fedor natural, ela começou a abrir uma dezena de potes cheios de comida. E o que tinha dentro de um dos potes? Peixe! Isso mesmo, peixe. Como diria minha mãe, foi uma "fedentina" só. Mas sobrevivemos e, finalmente, chegamos à Paris.  Na cidade da Torre, ficamos instaladas no pequeno apartamento de Shantal - uma el salvadorenha bastante simpática e hospitaleira -, amiga de Maria - uma das pessoas queridas que me recebeu no aeroporto. Minha estadia lá foi bastante interessante em termos de aprendizado. Digo isso porque o apartamento era bem pequeno e nós três dividimos um, ainda mais pequeno, quarto - me desculpe a gramática  portuguesa -, por três noites. Para que tenha uma noção boa do que estou dizendo, imagine uma cama de casal. Imaginou? Pronto. Essa é a boa noção à qual me refiro. O quarto era do tamanho de uma cama de casal com o agravante de ter uma cama de casal dentro. Sentiu o drama? Pois eu também e afirmo categoricamente que sou uma pessoa que precisa de espaço. E, quanto ao aprendizado, posso dizer que esses dias me possibilitaram exercitar a capacidade de compressão da minha bagunça. Sim, porque para quem não sabe, eu sou uma pessoa bagunceira. E como todo bagunceiro, afirmo: a minha bagunça  é organizada, OK?  Quanto ao Ano Novo, as histórias serão contadas pessoalmente, mas já adianto que foi regado a música latina, petiscos, fondue de queijo e ice tea. Dispensei o champagne, o vinho, a vodca e a maconha. Nada como observar o início de um novo ciclo com a sobriedade que Deus me deu.  Quanto aos passeios pela gastronomia e ruas  parisienses, posso dizer que foram bastante jovens e despretensiosos. As baguettes são uma delícia, o crepe de nutella um presente dos deuses! O chão de pedra nos remete às histórias que a cidade nos conta. É tudo realmente lindo, histórico e artístico.  Após esses três dias, optei por continuar minha incursão pelo universo francês indo para Grenoble. Tomei o TGV (um trem mais rápido) e quando achei que a viagem seria tranqüila, pensamentos neuroticos começaram a permear minha imaginação fértil. Explico. À minha frente, estava sentado um homem com seu casaco e sua mochila. Como era de se esperar, após o balancinho inicial do trem, caí no sono. Entre uma abertura e outra de olhos, percebi que o cara não estava ali mas havia deixado seu casaco e sua mochila. Meu primeiro pensamento foi que o cara, naturalmente, tinha dado uma passada na toilette. Feche os olhos novamente e acordei uns 40 minutos depois, quando o trem fez sua primeira parada. E quem disse que o cara tinha voltado? Foi nesse exato momento que minha imaginação começou a rolar e meu primeiro pensamento neurótico foi " estou na Europa, esse cara é um terrorista, tem uma bomba nessa mochila" e o segundo foi a visualização em 3D da capa dos principais jornais do Brasil: a manchete "jovem brasileira morta em atentado terrorista na França" e embaixo, grande, as fotos do vagão destroçado seguida da minha foto, pequenina, da carteira de motorista. Por esses e outros pensamentos que resolvi mudar de vagão e lá fui eu caminhando pelo trem. Achei o lugar, coloquei minhas coisas e, quando estava me ajeitando para dormir de novo, ouvi a gargalhada estridente de uma jovem com traços árabes, franconfona, que conversava com outras duas nas cadeiras próximas à minha. Pensei "é hoje!". A mulher falava alto, ria alto e - como se já não fosse o suficiente - cantarolava e dançava a música do Tropa de Elite. Inacreditável ter o meu sono perturbado por um ataque a bomba e a música do Tropa de Elite na mesma noite! Não seria naquela viagem de trem que eu tiraria uma pestana. E não foi. Incomodado com o barulho da gorducha árabe, um homem se levantou indignado e começou a lhe falar poucas e boas. Arregalei os olhos; não entendia uma palavra. Nunca havia me sentido tão gringa, quanto nesse momento! O homem começou a gesticular e a falar alto. A gorducha revidava à altura. Outras pessoas, igualmente incomodadas com a baderna da jovem, começaram a falar também. Ouso dizer que os dois jovens só não partiram para as vias de fato porque os seguranças do trem interviram. Resumindo: presenciei meu primeiro - e espero que único - barraco europeu, com direito a gritos, choro e - por muito pouco faltaram - pontapés. Em tempo, vale dizer que a falta de educação é global.  Bem, e é aqui que termina a primeira parte de minhas aventuras em solo francês. Cheguei bem à Grenoble e, aleluia!, tenho aqui todo espaço de que preciso. Esta será a minha casa por uns bons 20 dias. À bientôt, mes amis!